domingo, 14 de junho de 2009

OUTUBRO, 15 (1915)

Em cima: da esquerda para a direita : Leon Tolstoy. capa de seu livro, e Ludvig vo Beethoven
Em baixo: bridgetower, novamente a capa do livro do Tolstoi, a capa da partitura da sonata e, finalmente, Kreutzer, o violonista homenageado
Amanheci ainda indisposto, mas esta indisposição passou logo. Tomei um esplêndido banho e começo a ler “A Sonata a Kreutzer". Chega da Europa, no “Araguaia”, uma família inglesa com muita bagagem. Compõe-se a tal família de dois senhores e uma senhora. Recebo uma carta do Eduardo Sá prevenindo que ainda não está no sanatório porque não há cômodo. Este Eduardo é um brasileiro que foi meu companheiro de viagem e se destinava ao Sanatório de Guarda, que dizem ser excelente. Pedi- lhe que me escrevesse mandando dizer como era a vida no tal Sanatório, qual o regime, quando se despende e quais as condições de admissão.
Durmo um pouco depois do lanche. Ao jantar, a enfermeira do argentino, a quem me queixei das insônias que tenho sofrido ultimamente, fez o criado voltar com a bandeja de café que me trazia e com uma autoridade de quem pode, proibiu-me o uso do café. Obedeci e recolhi-me cedo.
______________________________________________

Sonata para violino e piano nº 9, em lá maior, op. 47, de Ludwig van Beethoven (1770-1827) foi inicialmente dedicada a George Augustus Polgreen Bridgetower (1779-1860), um violinista mulato da Polónia e que depois, como relata a tradição, por uma fútil questiúncula amorosa, acabou por ser presenteada a Rodolphe Kreutzer (1766-1831), um violinista francês que tinha visitado Viena em 1798 e que Beethoven o descreveu como um “querido e afável companheiro que durante sua permanência em Viena me proporcionou muito prazer” (Carta 99).

Quais as origens históricas desta sonata? Em 1790, Bridgetower emigrou para Londres e depois, em 1802, começou por visitar a Europa continental numa ‘tournée’ de concertos para mostrar o seu virtuosismo violinístico e ganhar assim algum dinheiro. Chegou a Viena no início de Abril de 1803. O príncipe Karl Lichnowsky (1756-1814), aristocrata da corte de Viena (Áustria), amigo e mecenas de Beethoven, já desde 1792, apresentou-o ao compositor e este, entre 1802-1803, compôs para Bridgetower uma sonata para violino e piano, cuja data da estreia foi anunciada para o dia 22-05-1803. Por fim, talvez porque a sonata ainda não estivesse pronta, o certo é que o recital só ocorreu passados dois dias, isto é, no dia 24. Uma partitura autógrafa fragmentária da obra intitula-a de «Sonata Mulattica» precisamente porque Bridgetower era mulato. Segundo uma tradição, Beethoven e Bridgetower tiveram uma forte discussão sobre o aspecto duma mulher… Beethoven, furioso, desiste da sua oferta que tinha feito, não a catalogando por sonata «Bridgetower», mas, sim, de «Kreutzer», porque acaba por a dedicar a um já seu grande amigo, Rodolphe Kreutzer (1766-1831), um outro violinista, embora francês.

Em 1889, Liev Tolstói (1828-1910), escritor russo, publicou, em 28 capítulos, uma história curta intitulada «A Sonata Kreutzer», cujo tema principal é a reafirmação dos valores do espírito perante um desregrado fluir das paixões e dos sentidos.

O filme «Immortal Beloved» («A Amada Imortal»), de 1994, que versa mormente a vida amorosa de Ludwig van Beethoven, mostra claramente, no diálogo entre Beethoven (Gary Oldman) e Anton Felix Schindler (Jeroen Krabbé) – em cuja cena está estampado o capítulo 23 dessa obra de Tolstói – que nesta sonata está latente, na mente do compositor de Bona, a ideia musical de um amante tentar alcançar a sua amada, não obstante a chuva, a trovoada e a lama da carruagem impedirem o seu propósito. Mas ao certo não existem fontes históricas fidedignas a comprovar esta simples conjectura literária.

Nenhum comentário:

Postar um comentário